14 de maio de 2013

ESPECULAÇÃO SOBRE "A BURGUESIA: UMA DEFINIÇÃO"



Onde e quando nasce a burguesia? Esta pergunta terá tantas respostas quantos forem os modelos de pensamento utilizados para tentar respondê-la. 
Como é útil definir alguns pontos de partida quando se quer conversar mais profundamente sobre algo, vamos propor um rascunho para essa indagação.
Começa assim: a palavra remete a "burgo", que seriam os protótipos do que hoje conhecemos por "cidades". O burguês é seu habitante e a burguesia o conjunto formado pelas pessoas assim classificadas.
Desde o século XII já é possível identificar pessoas cujas ocupações se distinguem do grande número de trabalhadores braçais (e demais grupos de baixo prestígio, despossuídos, mendigos etc.) que formavam a enorme base da pirâmide medieval. 
Conforme esta camada vai se desenvolvendo, vai ficando cada vez mais numerosa e influente. No comércio, na construção, na manufatura, nos serviços burocráticos, são várias as áreas de ocupação que ficam a cargo dessas pessoas. Mas claro, é preciso lembrar que essa história não é simplesmente linear, mas atravessada por refluxos de época em época.  
Os séculos XVIII-XIX assistiram a uma transformação e reorganização política-social-econômica-cultural, em grande parte, pela consolidação da chamada classe burguesa como grupo dominante. No marxismo clássico, o termo burguesia designava a camada de proprietários de capital, profissionais liberais e certa classe política que foi gradativamente assumindo posições de  poder e que se torna a classe dominante a partir da implantação dos novos sistemas de governo cujo marco histórico é a Revolução Francesa (1789).  
O termo burguês atravessa o século XX e se abre para múltiplas interpretações. Devido à relativa transformação das classes trabalhadoras, que ao final do século XX vão sendo integradas à sociedade de consumo, é possível compreender que um processo de aburguesamento das classes médias e baixas transformou o cenário de conflito de classes - tão mais claro na época do Manifesto do Partido Comunista, de Marx e Engels - em um universo no qual o sentimento de pertencimento das massas trabalhadoras à chamada "classe operária" (ou proletariado) vai sendo diluído e fazendo com que assalariados e pequenos empreendedores assumam a postura, a moral, a lógica, a ética e a ideologia da burguesia.
Alguns aspectos e valores próprios da burguesia que serão absorvidos progressivamente pela massa desses novos cidadãos e consumidores seriam: a extensão da cidadania à totalidade da população; a valorização do conhecimento (por meio de escolas, universidades, cursos...) e sua divulgação (o gosto pelos livros, impressos, web, TV...); a burocracia e a jurisprudência como ferramentas capazes de  regular as relações entre indivíduos e promover a igualdade entre eles; a ideia de Estado laico, mas em convívio harmonioso com as religiões; a valorização do pensamento científico e das ideias racionais; o sentimento de que o progresso e a técnica elevaram a humanidade a um estágio de segurança e conforto materiais jamais alcançado na história; a aplicação da lógica do capital a quase todos os setores do cotidiano; a noção de tempo linear e acumulativo... Mas é possível objetar que alguns desses aspectos são muito mais ideais e retórica do que princípios de fato.
A lista acima não para por aí e é gigantesca, mas o que pretendemos aqui é apenas esboçar um painel que nos daria uma certa noção do que poderia, hoje, servir para qualificar o "ser burguês". Daí que, quando falamos em sociedade e pensamento burgueses, podemos usar este tipo de conceito, que não é o de uso mais comum, mas funciona quando a mirada busca entender algum fenômeno levando em consideração não apenas uma centena de anos, mas toda a gestação, implementação e transformação dessa sociedade que veio substituir o que ficou conhecido por "sociedade feudal", ou Idade Média.
Até quando ela irá existir não sabemos, mas é o que hoje aí se encontra. 

IMAGEM: O Casal Arnolfini (Jan Van Eyck - 1434)

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