8 de maio de 2014

AS CORES DA VIOLÊNCIA

É preciso distinguir A de B. Sempre. 
O linchamento do Guarujá se difere dos milhares que os antecederam na nossa triste e truculenta história devido ao poder midiático de suas imagens se espalharem nas redes sociais sem a filtragem tradicional da antiga imprensa (que não exibia as imagens, e quando o fazia editava as cenas para não chocar tanto, além de não haver - na época pré-web - a possibilidade de se rever a qualquer momento o vídeo). Em vários outros aspectos ele é idêntico aos ocorridos nos anos 20, 40, 60 etc. 
O sadismo que promove o ato do linchamento em si, se espalha agora nas páginas eletrônicas e alimenta uma cultura da perversão em forma de visualizações, curtidas e comentários (sempre espantosos).
As causas desse tipo de violência têm suas raízes no fascismo do senso comum, no desejo de promoção de justiça muitas vezes provocado pela injustiça reinante no cotidiano das massas pobres, na introjeção dos discursos agressivos propagandeados por programas televisivos e radiofônicos, na intolerância de todo tipo devido à baixa promoção do real respeito às diferenças (que é substituído astuciosamente pelo respeito somente a algumas diferenças e em alguns lugares e não a todas e todos) e onde mais se quiser procurar.
Inevitavelmente me vi pensando também sobre outras coisas. Por exemplo, se Fabiane Maria de Jesus fosse preta (termo usado pelo IBGE), choveriam acusações de racismo, sendo que por racismo entendo o ódio manifesto por pessoas de uma raça específica, o que é diferente de preconceito de cor, repulsa a pessoas de determinadas cores, em geral, por tais cores serem associadas a classes econômicas baixas e a moradores de áreas periféricas. Até estranhei o fato de haver poucas acusações de que se trata de um caso de machismo, já que a vítima é uma mulher. O que quero dizer é que reduzir um ato complexo a uma causa única (racismo, machismo etc.) não ajuda em nada a compreender os reais motivos que geraram tal ato e, por conseguinte, não ajuda também na criação de mecanismos de prevenção de futuras violências, uma vez que se atacam causas paralelas e não as centrais. 
Esclarecendo: há racismo e machismo em nossa sociedade, muito mais do que imaginamos. Mas é preciso identificar exatamente onde, quando, como, por que e com quem isto acontece. O uso do raciocínio mecânico e míope das militâncias superficiais, ou seja, daquelas pessoas que transformam lutas históricas e fundamentadas em dogmas obscuros e slogans oportunistas, só faz aumentar as divergências, antagonismos, intolerâncias e isto inevitavelmente descamba em algum tipo de violência.
Outras fabianes virão e a mídia, que tanto parece se indignar com tais fatos, finge-se de desavisada e não assume sua função pública de informar, esclarecer e promover debates civilizados sobre os destinos da sociedade. Talvez o fato de tais atos de violência serem explorados e capitalizados por esta mesma mídia indignada explique o porquê desse incômodo silêncio. 

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